sexta-feira, 22 de novembro de 2013

E.R.

fuçou nas gavetas até encontrar a camisa azul marinho que havia comprado há dois meses atrás. era uma grande estréia. tinha novos sorrisos em vista, embora o coração ainda cultivasse um velho amor, como aqueles papéizinhos onde a gente escreve uma pseudo poesia numa noite de solidão e alcoolismo e que acabam perdidos no fundo de uma gaveta qualquer. 
se arrumou, escolheu um rock pra animar o caminho e seguiu. entrou no bar meio desconfiada, quase colocando no bolso a mão que não estava segurando a bebida pra disfarçar o nervosismo, não gostava de chegar sozinha nos lugares, mas aquele era um dia especial. e de repente um salto cardíaco anunciou a presença de alguém que nunca havia estado perto. e seus olhos não se desgrudaram mais. aquela voz era um tom mais grave do que havia imaginado, quase não combinando com aquele rosto de traços tão finos. e aqueles gestos, o caminhar, a respiração, tudo, tudo que não teria como ter imaginado a tocavam de um jeito que ela não queria mais se afastar daquele corpo tão quase seu. ouviu palavras de "pra sempre" pelo olhar.
dois goles depois, tudo se perdeu. o lugar passou a ter muitos cantos e cada um foi pro seu. passos rápidos de procura a levaram para cada vez mais longe. onde tinha ido parar aquele sorriso? nada mais fazia sentido. não havia conseguido manter aquelas palavras ditas momentos antes. os olhos ficaram cansados de tanto procurar. já estava começando a se esquecer daquela voz. nenhuma palavra. não sabia lidar com fins inesperados. quanto daquilo tudo era realidade? haviam de fato olhares e sorrisos? 
juntou a frustração, o medo da rejeição, a saudade que sabia que sentiria, a despedida não pronunciada, o vácuo entre aqueles pés e, quase que na velocidade da luz, terminou a noite com o coração partido no primeiro poste de um caminho sem volta. e todo o sofrimento medicado finalmente teve um fim.